segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Felicidade Limitada


                                     

            Saí do consultório médico. Eu estava incrédulo e ao mesmo tempo, inconformado. Como pode ter acontecido isso?  Justo comigo? Por que eu? – Pensava a todo instante.

O exame diagnosticara HIV positivo. No início, pensei tratar-se de apenas mais uma das brincadeiras do médico, muito amigo meu. Mas seu ar de seriedade dilacerava todas as minhas esperanças. Durante o percurso para casa, ultrapassei dois sinais vermelhos e quase atropelei um garoto que vendia doces no semáforo. Não conseguia pensar em mais nada, apenas no resultado do exame. Tinha então trinta e dois anos, uma esposa e dois filhos ainda pequenos.

No meio do caminho, mudei de planos. Dirigi-me à praça mais próxima. Não estava consciente o suficiente para chegar em casa e encarar minha esposa. Tão linda e sensível, não poderia imaginar que eu estava com AIDS. Não poderia imaginar minha infidelidade.

Estacionei o carro e sentei-me em um banco da praça, queria pôs as idéias no lugar. Arrependido era o adjetivo mais apropriado para mim naquele momento. AIDS, eu estava com AIDS. Era quase inacreditável aquela realidade. Como eu pude ter sido tão inconseqüente? Como eu pude me aventurar tanto? Entrei na chuva e me molhei.

Olhei para o lado e vi um casal sorridente, observando seus dois filhos em uma gangorra. Aquela era uma família feliz, dava para ver nos olhos de cada um. Nós éramos felizes também, mas nossa felicidade agora se limitara. Provavelmente eu não veria meus dois anjinhos chagarem à adolescência e não lhes ensinaria a fazer a barba ou outras coisas que só “papai” poderia fazer, e isso me partia profundamente o coração. Provavelmente, minha esposa iria sofrer com o meu problema e se dedicar de corpo e alma ao meu tratamento, esquecendo-se completamente de si mesma. Iria pagar pelo que não devia. Iria sofrer as dores que eu merecia sofrer sozinho.

Desejei nunca mais ter que voltar para casa. Desejei que o tempo parasse para nunca mais ter que sair daquele banco. Ah, como eu desejei voltar ao passado e consertar tudo, tudo o que não tinha conserto.

Tomei coragem, levantei-me e entrei no carro. Estava disposto a falar, a chorar e a pedir perdão. Estava disposto a encarar o início de um fim.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Esperança

(Conto originalmente criado em 2004, e posteriormente foi o 1° lugar no concurso cultural Oficina Do Pensar no ano de 2006.)
 
 
 
 
 


O sol estava alto, meus filhos com fome. Eu... Eu estava esgotada! Dor de cabeça, pés ardendo ao chão, dores na coluna, sede, fome...

Vagas lágrimas escorriam pela face de minha filha mais velha, ela entendia perfeitamente a situação. Minha linda... Compreensiva e sensível, sempre quis estudar. Aprender a ler e escrever era seu sonho de infância. Mas sua compreensão a fazia entender que isso nunca seria possível. Por mais que fôssemos otimistas, não poderíamos deixar de enxergar a realidade.

Meus dois filhos pequenos brincavam com uma caixa de papelão. Ora eram astronautas, ora motoristas, ora marinheiros... Mas como toda brincadeira, esta iria acabar, e meus meninos iriam perceber a fome aumentando. Minha tristeza também iria aumentar.

Olhei para frente, para os lados: Nada, apenas terra seca. Havia anos que não chovia por aqui, a seca levara embora as plantações e o gado.

Maldita seca! Deixou-nos sem nada! Meu Deus, como o mundo é injusto, como a vida é triste! Ai, Deus, por que o Senhor levou meu marido e minha duas filhas de mim? Para me ver sofrendo? Para me ver morrendo aos poucos? Para ver meus filhos desnutridos e desidratados? Pois o Senhor conseguiu! E agora, o que me resta, senão a morte?!

Desliguei-me dos meus pensamentos ao perceber que o céu estava nublando. Teria Deus me compreendido?

Ajoelhei-me e chorei. No nosso dicionário ainda restava uma palavra: Esperança. 



 

Desistir, Rafaele?! Que decepcão...



Foi isso que minha voz interior me falou agora pela manhã. Na realidade, havia me desencantado com esse blog. As pessoas hoje em dia tem preguiça de ler e quando veem que meu conto é relativamente longo para suas limitações, desistem. E eu fico a ver navios.
E isso me fez desanimar, desanimar... até esquecer que eu havia começado esse blog.
Mas enfim, acho que há pessoas, que como eu, gostam de uma leitura um pouco mais demorada, que dure mais de três minutos. Poucas, umas três ou quatro pessoas, mas há.
E é por causa dessas três ou quatro pessoas, que vou continuar postando.
Pode ser que eu tenha apenas uma visualização a cada dois dias, ou mesmo uma visualização por semana (melhor ser pessimista, que se frustrar. É como eu sempre digo, hehehehehe...), mas aí eu vou saber que o que eu estou colocando não está sendo em vão.
Mais uma vez muito obrigada se você chegou até essa frase. Desejo tudo de bom pra você!